GTO - Gate Turn-Off Thyristor 

Autores:
     Fábio Soares Gomes
     Leandro Carneiro da Silva Annibal
     Marina Cruz
     Pablo Pastore

Índice
     I.    Introdução
     II.   Princípio de Funcionamento
     III.  Parâmetros Básicos do GTO
     IV. Condições do Sinal de Gate para Chaveamento
     V.  Vantagens do Uso do GTO
     VI. Circuitos Amaciadores (Snubber)
          6.1  Desligamento
          6.2  Entrada em Condução
     VII. Associações em Série e em Paralelo
     VIII.Referências Bibliográficas


I.   Introdução

     Todos os tiristores só se desligam quando a corrente cai abaixo da corrente de manutenção, o que exige circuitos especiais de desligamento em certos casos. O GTO permite o desligamento pelo gate, por pulso negativo de alta corrente, daí o nome (Gate Turn Off, desligamento pelo gate).
     Estruturalmente, é similar ao SCR, mas a dopagem e a geometria da camada do gate permite minimizar o sobre-aquecimento durante o desligamento (o que destruiria um SCR). O desligamento é feito em geral através de descarga de um capacitor.
     O GTO, embora tenha sido criado no início da década de 60, foi pouco utilizado no início por problemas de fraco desempenho. Com o avanço da tecnologia de construção de dispositivos semicondutores, novas soluções foram encontradas para aprimorar tais componentes, que hoje ocupam significativa faixa de aplicação, especialmente naquelas de elevada potência, uma vez que estão disponíveis dispositivos para 5000V, 4000A.


II.   Princípio de Funcionamento

     O GTO possui uma estrutura de 4 camadas, típica dos componentes da família dos tiristores. Sua característica principal é sua capacidade de entrar em condução e bloquear através de comandos adequados no terminal de gate.
     O mecanismo de disparo é semelhante ao do SCR: supondo-o diretamente polarizado, quando a corrente de gate é injetada, circula corrente entre gate e catodo. Grande parte de tais portadores desloca-se até a camada N adjacente (já que a camada de gate é suficientemente fina), atravessando a barreira de potencial e sendo atraídos pelo potencial do anodo, dando início à corrente anódica. Se esta corrente se mantiver acima da corrente de manutenção, o dispositivo não necessita do sinal de gate para manter-se conduzindo.
     A figura 1 mostra o símbolo do GTO e uma representação simplificada dos processos de entrada e saída de condução do componente.
     A aplicação de uma polarização reversa na junção gate-catodo pode levar ao desligamento do GTO. Portadores livres (lacunas) presentes nas camadas centrais do dispositivo são atraídos pelo gate, fazendo com que seja possível o restabelecimento da barreira de potencial na junção J2.



Figura 1. Símbolo, processos de chaveamento e estrutura interna de GTO.




     Aparentemente, seria possível tal comportamento também no SCR. As diferenças, no entanto, estão no nível da construção do componente. O funcionamento do GTO é possível devido a alguns fatores, como por exemplo:

  • Facilidade de extração de portadores pelo terminal de gate. Isto é possibilitado pelo uso de dopantes com alta mobilidade
  • Desaparecimento rápido de portadores nas camadas centrais. Uso de dopante com baixo tempo de recombinação. Isto implica que um GTO tem uma maior queda de tensão quando em condução, comparado a um SCR de mesmas dimensões
  • Suportar tensão reversa na junção porta-catodo, sem entrar em avalanche. Menor dopagem na camada de catodo;
  • Absorção de portadores de toda superfície condutora. Região de gate e catodo muito interdigitada, com grande área de contato.

     Diferente do SCR, um GTO pode não ter capacidade de bloquear tensões reversas.
     Existem duas possibilidades de construir a região de anodo. Uma delas é utilizando apenas uma camada p+, como nos SCR. Neste caso o GTO apresentará uma característica lenta de comutação, devido à maior dificuldade de extração dos portadores, mas suportará tensões reversas na junção J3.
     A outra alternativa, mostrada na figura 2, é introduzir regiões n+ que penetrem na região p+ do anodo, fazendo contato entre a região intermediária n- e o terminal de anodo. Isto, virtualmente, curto-circuita a junção J1 quando o GTO é polarizado reversamente. No entanto, torna-o muito mais rápido no desligamento (com polarização direta). Como a junção J3 é formada por regiões muito dopadas, ela não consegue suportar tensões reversas elevadas. Caso um GTO deste tipo deva ser utilizado em circuitos nos quais fique sujeito a tensão reversa, ele deve ser associado em série com um diodo, o qual bloqueará a tensão.



Figura 2. Estrutura interna do GTO.



III.   Parâmetros Básicos do GTO

     Os símbolos utilizados pelos diversos fabricantes diferem, embora as grandezas representadas sejam, quase sempre, as mesmas.

  • Vdrxm - Tensão de pico, repetitiva, de estado desligado. Sob condições dadas, é a máxima tensão instantânea permissível, em estado desligado, que não ultrapasse o dv/dt máximo, aplicável repetidamente ao GTO;
  • It - Corrente (RMS) de condução. É o máximo valor RMS de corrente que pode circular continuamente pelo GTO;
  • Itcm - Corrente de condução repetitiva controlável. Corrente máxima repetitiva, cujo valor instantâneo ainda permite o desligamento do GTO, sob determinadas condições;
  • I2t - escala para expressar a capacidade de sobrecorrente não-repetitiva, com respeito a um pulso de curta duração. É utilizado no dimensionamento dos fusíveis de proteção;
  • di/dt - taxa de crescimento máxima da corrente de anodo;
  • Vgrm - Tensão reversa de pico de gate repetitiva. Tensão máxima instantânea permissível aplicável à junção gate-catodo;
  • dv/dt - máxima taxa de crescimento da tensão direta de anodo para catodo;
  • IH - corrente de manutenção. Corrente de anodo que mantém o GTO em condução mesmo na ausência de corrente de porta;
  • IL - corrente de disparo. Corrente de anodo necessária para que o GTO entre em condução com o desligamento da corrente de gate;
  • tgt - tempo de disparo. Ttempo entre a aplicação da corrente de gate e a queda da tensão Vak;
  • tgq - tempo de desligamento. Tempo entre a aplicação de uma corrente negativa de gate e a queda da corrente de anodo (tgq=ts+tf);
  • ts - tempo de armazenamento.


IV.   Condições do Sinal de Gate para Chaveamento

     Desde que o GTO esteja submetido a condições de alto di/dt, é necessário que o sinal de gate também tenha rápido crescimento, tendo um valor de pico relativamente elevado. Deve ser mantido neste nível por um tempo suficiente (tw1) para que a tensão Vak caia a seu valor de condução direta. É conveniente que se mantenha a corrente de gate durante todo o período de condução, especialmente se a corrente de anodo for pequena, de modo a garantir o estado "ligado". A figura 3 ilustra as formas de corrente recomendadas para a entrada em condução e também para o desligamento.
     Durante o intervalo "ligado" existe uma grande quantidade de portadores nas camadas centrais do semicondutor. A comutação do GTO ocorrerá pela retirada destes portadores e, ainda, pela impossibilidade da vinda de outros das camadas ligadas ao anodo e ao catodo, de modo que a barreira de potencial da junção J2 possa se restabelecer.
     O grande pico reverso de corrente apressa a retirada dos portadores. A taxa de crescimento desta corrente relaciona-se com o temo de armazenamento, ou seja, o tempo decorrido entre a aplicação do pulso negativo e o início da queda (90%) da corrente de anodo. Quanto maior for a derivada, menor o tempo.
     Quando a corrente drenada começa a cair, a tensão reversa na junção gate-catodo cresce rapidamente, ocorrendo um processo de avalanche. A tensão negativa de gate deve ser mantida próxima ao valor da tensão de avalanche. A potência dissipada neste processo é controlada (pela própria construção do dispositivo). Nesta situação a tensão Vak cresce e o GTO desliga.
     Para evitar o disparo do GTO por efeito dv/dt, uma tensão reversa de porta pode ser mantida durante o intervalo de bloqueio do dispositivo.
     O ganho de corrente típico, no desligamento, é baixo (de 5 a 10), o que significa que, especialmente para os GTOs de alta corrente, o circuito de acionamento, por si só, envolve a manobra de elevadas correntes.



Figura 3. Formas de onda típicas do circuito de comando de porta de GTO.



V.   Vantagens do Uso do GTO

     Os GTOs têm algumas vantagens sobre os SCRs, como por exemplo:

  • Eliminação de componentes de comutação em comutações forçadas, resultando em reduções de custo, peso e volume;
  • Redução de ruídos acústicos e eletromagnéticos, devido à eliminação de "estrangulamentos"de comutação;
  • Desligamento mais rápido, permitindo maiores freqüências de chaveamento;
  • Melhoria na eficiência dos conversores.

     A principal diferença entre o GTO e o GATT (Gate Assisted Turn Off Thyristor) é o de que o GTO pode ser desligado através da aplicação de corrente negativa no gate, enquanto que o anodo é polarizado positivamente com respeito ao catodo. Por outro lado, para o GATT ser desligado, o catodo precisa ser polarizado positivamente com respeito ao anodo, e uma polarização negativa no gate só irá reduzir o tempo do processo de desligamento
     Em aplicações de baixa potência, os GTOs têm as seguintes vantagens sobre os transistores bipolares:

  • A capacidade de uma maior barreira de potencial;
  • Um alto ganho "on-state" (corrente de anodo / corrente de gate), normalmente 600;
  • Curta duração de sinal de pulso no gate. Sob condições de oscilações, os GTOs entram em uma alta saturaçao, devido à ação regenerativa. Por outro lado, os BJTs tendem a sair do modo de saturação


VI.   Circuitos Amaciadores (Snubber)

     O objetivo destas redes é evitar problemas advindos de excessivos valores para dv/dt e di/dt.


     6.1   Desligamento

     Durante o desligamento, com o progressivo restabelecimento da barreira de potencial na junção reversamente polarizada, a corrente de anodo vai se concentrando em áreas cada vez menores, concentrando também os pontos de dissipação de potência. Uma limitação da taxa de crescimento da tensão, além de impedir o disparo por efeito dv/dt, implicará numa redução da potência dissipada nesta transição.
     O circuito mais simples utilizado para esta função é uma rede RCD, como mostrado na figura 4.
     Supondo uma corrente de carga constante, ao ser desligado o GTO, o capacitor se carrega com a passagem da corrente da carga, com sua tensão variando de forma praticamente linear. Assim, o dv/dt é determinado pela capacitância. Quando o GTO entrar em condução, este capacitor se descarrega através do resistor. A descarga deve ocorrer dentro do mínimo tempo em condução previsto para o GTO, a fim de assegurar tensão nula inicial no próximo desligamento. A resistência não pode ser muito baixa, a fim de limitar a impulso de corrente injetado no GTO.



Figura 4. Circuito amaciador de desligamento tipo RCD.




     A energia armazenada no capacitor será praticamente toda dissipada em R. Especialmente em aplicações de alta tensão e alta freqüência, esta potência pode assumir valores excessivos. Em tais casos deve-se buscar soluções ativas, nas quais a energia acumulada no capacitor seja devolvida à fonte ou à carga.
     A potência a ser retirada do capacitor é dada por:



onde V é a tensão de alimentação e fs é a freqüência de chaveamento.
     Como exemplo, suponhamos um circuito alimentado em 1000V, operando a 1kHz com um capacitor de 1mF. Isto significa uma potência de 500W!


     6.2   Entrada em Condução

     A limitação de di/dt nos GTOs é muito menos crítica do que para os SCR. Isto se deve à interdigitação entre gate e catodo, o que leva a uma expansão muito mais rápida da superfície em condução, não havendo significativa concentração de corrente em áreas restritas.
     O problema relacionado ao crescimento da corrente refere-se, para um GTO, à potência dissipada na entrada em condução do dispositivo. Com carga indutiva, dada a necessária existência de um diodo de livre-circulação (e o seu inevitável tempo de desligamento), durante alguns instantes em que o GTO já se encontra conduzindo, sobre ele também existe uma tensão elevada, produzindo um pico de potência sobre o componente. Este fato é agravado pela corrente reversa do diodo e ainda pela descarga do capacitor do snubber de desligamento (caso exista). A figura 5 ilustra este comportamento.



Figura 5. GTO acionando carga indutiva e amaciador para desligamento.




     Para reduzir este efeito, um circuito snubber para o disparo pode ser necessário, com o objetivo de reduzir a tensão sobre o GTO em sua entrada em condução, pode-se utilizar um circuito amaciador formado, basicamente, por um indutor com núcleo saturável, que atue de maneira significativa apenas durante o início do crescimento da corrente, mas sem armazenar uma quantidade significativa de energia.


VII.   Associações em Série e em Paralelo

     Nas situações em que um componente único não suporte a tensão ou a corrente de uma dada aplicação, é necessário associar componentes em série ou em paralelo. Nestes casos os procedimentos são similares àqueles empregados para os SCRs.
     Quando a corrente de carga, ou a margem de sobre-corrente necessária, não pode ser suportada por um único tiristor, é essencial a ligação em paralelo. A principal preocupação neste caso é a equalização da corrente entre os dispositivos, tanto em regime, como durante o chaveamento. Diversos fatores influem na distribuição homogênea da corrente, desde aspectos relacionados à tecnologia construtiva do dispositivo, até o arranjo mecânico da montagem final.
     Existem duas tecnologias básicas de construção de tiristores, diferindo basicamente no que se refere à região do catodo e sua junção com a região de gate. A tecnologia de difusão cria uma região de fronteira entre catodo e gate pouco definida, formando uma junção não-uniforme, que leva a uma característica de disparo (especialmente quanto ao tempo de atraso e à sensibilidade ao disparo) não homogênea. A tecnologia epitaxial permite fronteiras bastante definidas, implicando numa maior uniformidade nas características do tiristor. Conclui-se assim que, quando se faz uma associação (série ou paralela) destes dispositivos, é preferível empregar componentes de construção epitaxial.
     Em ligações paralelas de elementos de baixa resistência, um fator crítico para a distribuição de corrente são variações no fluxo concatenado pelas malhas do circuito, dependendo, pois, das indutâncias das ligações. Outro fator importante relaciona-se com a característica do coeficiente negativo de temperatura do dispositivo, ou seja, um eventual desequilíbrio de corrente provoca uma elevação de temperatura no SCR que, por sua vez, melhora as condições de condutividade do componente, aumentando ainda mais o desequilíbrio, podendo levá-lo à destruição.
     Uma primeira precaução para reduzir estes desbalanceamentos é realizar uma montagem de tal maneira que todos os tiristores estejam a uma mesma temperatura, o que pode ser feito, por exemplo, pela montagem em um único dissipador.
     No que se refere à indutância das ligações, a própria disposição dos componentes em relação ao barramento afeta significativamente esta distribuição de corrente. Arranjos cilíndricos tendem a apresentar um menor desequilíbrio.
     Quando o circuito opera com tensão superior àquela suportável por um único tiristor, é preciso associar estes componentes em série, com precauções para garantir a distribuição equilibrada de tensão entre eles. Devido a diferenças nas correntes de bloqueio, capacitâncias de junção, tempos de atraso, quedas de tensão direta e recombinação reversa, redes de equalização externa são necessárias, bem como cuidados quanto ao circuito de disparo.
     A figura 6 indica uma possível distribuição de tensão numa associação de 3 tiristores, nas várias situações de operação.



Figura 6. Tensões em associação de tiristores sem rede de equalização.




     Durante os estados de bloqueio direto e reverso (I e VI), diferenças nas características de bloqueio resultam em desigual distribuição de tensão em regime. Ou seja, o tiristor com menor condutância quando bloqueado terá de suportar a maior tensão. É interessante, então, usar dispositivos com características o mais próximas possível.
     Os estados de condução (III e IV) não apresentam problema de distribuição de tensão. Estados II e V representam um desbalanceamento indesejado durante os transientes de disparo e comutação. No estado II o tempo de atraso do SCR1 é consideravelmente mais longo que o dos outros e, assim, terá que, momentaneamente, suportar toda a tensão. O estado V resulta dos diferentes tempos de recombinação dos componentes. O primeiro a se recombinar suportará toda a tensão.


VIII.   Referências Bibliográficas

   - Eletrônica de Potência
     J. A. Pomilio
     Publicação FEEC 01/98, Fevereiro de 1998, Revisado em Janeiro de 2000

   - Power Electronics - Devices, Drivers and Applications
     B. W. Willians
     MacMillan, 1987

   - Basic Principles of Power Electronics
     K. Heumann
     Springer-Verlag, 1986

   - Power Electronics - Circuits, Devices and Applications, 2nd. Edition
     M. H. Rashid
     Prentice Hall, 1993

   - Power Electronics, 3rd. Edition
     C. W. Lander
     McGraw-Hill, 1993