Histórico

            A tecnologia de Identificação por Rádio-Freqüência (RFID, na sigla em inglês) está presente em vários momentos da vida da pessoa comum, ainda que não seja sempre notada. O novo sistema de vale-transporte do Rio de Janeiro e alguns dos sistemas de pedágio automático como os presentes na ponte Rio-Niterói e na Linha Amarela são os exemplos mais tangíveis de tecnologias destinadas ao usuário final.
            A base da tecnologia é o uso inteligente de ondas de rádio e das suas propriedades de deflexão. A maioria das etiquetas (tags, em inglês) empregadas atualmente é do tipo passivo, significando que não necessitam de ligação direta a nenhuma fonte de energia. A onda de rádio emitida pelo aparelho leitor gera na antena da etiqueta uma corrente elétrica que é usada para alimentar seu Circuito Integrado (CI) interno, que repassa à antena a informação que foi programado para transmitir. Mais à frente trataremos de outros tipos de sistema RFID, mas todos obedecem mais ou menos a esse mesmo esquema de operação.
            A ondas de rádio e a radiação eletromagnética, grupo ao qual pertencem, surgiu no momento da criação do universo, mas a humanidade só compreendeu seus mecanismos de funcionamento nos séculos recentes. Num sentido bem fundamental, atribui-se aos chineses as primeiras observações de fenômenos magnéticos, utilizando imãs naturais, cerca de 100 anos antes de cristo. Pouca coisa se viu além disso até o século XVIII da nossa era, quando ocorreu uma explosão de conhecimento empírico e de métodos para tratar matematicamente os avanços obtidos nessa área.
            A partir das proposições do físico James Clerk Maxwell os avanços começaram a ocorrer rapidamente. Em 1864 ele concluiu que a energia elétrica e magnética viaja em ondas transversas que se propagam em velocidade igual a da luz. Em seguida, Heinrich R. Hertz, físico alemão, produziu e estudou ondas eletromagnéticas, confirmando em 1887 a teoria de Maxwell. Credita-se a Hertz o feito de ser o primeiro a produzir e receber ondas de rádio.
Os primeiros radares ocupavam uma sala inteira           Aplicações começaram a surgir para a nova ciência. Ainda no século XIX foram feitas as primeiras transmissões telegráficas intercontinentais utilizando ondas de rádio. À época, esses dispositivos faziam apenas a transmissão de centelhas entre placas metálicas sintonizadas. Isso significa que a onda, em si, não portava informação; sua presença ou ausência era codificada para ter significado. Tal tecnologia servia à telegrafia de pontos e traços usada naquele tempo, mas ainda era demasiadamente rudimentar para vislubrar as possibilidades modernas.
            Foi em 1906 que surgiram as primeiras ondas de rádio contínuas, pelas mãos de Ernst F. W. Alexanderson. Como nos aparelhos atuais, todos os aspectos da onda são controlados e empregados para a trasmissão da informação possibilitando a transmissão em maior volume e com menor ocorrência de erros.
            O passo seguinte seria o surgimento do radar, que permitiu avançar na criação das primeiras aplicações realmente de RFID. Ele funciona emitindo ondas de rádio em todas as direções e a sua reflexão, quando captada, permite identificar a presença, a posição e velocidade de objetos. Surgiu por volta de 1922 e os militares logo perceberam seu potencial, mantendo as novas descobertas em sigilo.
Codificador acoplável à fuselagem do avião. Modelo alemão da segunda guerra            No começo da segunda guerra mundial, os radares já eram amplamente empregados pelos dois lados oponentes, porém tinham uma grave deficiência. Apesar de muito úteis ao alertar sobre a presença de um avião quando este ainda se encontrava a quilômetros de distância, os aparelhos de então não tinham meios de indicar se o que se aproximava era amigo ou inimigo, sendo necessário contato visual ou via rádio para fazer a distinção.
            Os alemães descobriram muito casualmente que se os aviões girassem em seu eixo a onda refletida mudaria. Fazendo com que seus pilotos executassem essa manobra ao se aproximar da base eles conseguiram uma boa vantagem competitiva, pois esse método já lhes permitia distinguir amigos de inimigos na tela do radar.
            Um pouco depois, ainda no período de guerra, os ingleses alcançaram algo ainda mais notável. Construíram o primeiro sistema ativo para realizar esta tarefa, consistindo de um transmisor que, quando atingido por uma onda de radar, começava a transmitir um sinal que identificava a aeronave como amiga. Esse aparelho, chamado transponder, foi instalado em todos os aviões da força aérea inglesa da época e é usado, em versões atuais, em todos os aviões.
            O transponder utiliza o mesmo método da RFID e pode ser considerada sua primeira aplicação. A idéia e técnica necessários ao surgimento do RFID estavam lá, aguardando para serem notados. Um dos primeiros trabalhos no assunto foi "Communication by Means of Reflected Power" um artigo publicado em 1948 por Harry Stockman no periódico Proceedings of the IRE, editado pela IEEE.
            No seu “Comunicação através de energia refletida” (em tradução livre), Stockman concluiu: “Evidentemente, considerável pesquisa e trabalho de desenvolvimento deve ser feito antes que os problemas básicos restantes na comunicação por energia refletida sejam resolvidos e antes que o campo das aplicações úteis seja explorado.”

Primeiros aparelhos, aplicações e limitações

     •  EAS
            Por serem notavelmente simples, os sistemas de Vigilância Eletrônica de Artigos (EAS, na sigla em inglês) foram os primeiros a serem aplicados comercialmente. As primeiras etiquetas com esse fim continham apenas um bit de informação, ativo ou inativo. Apenas a presença ou ausência podiam ser sentidas, mas isso bastava para prover eficientes medidas anti-furto. São claramente a aplicação RFID mais largamente utilizada no comércio.
Historico 3            Devido à polarização do campo magnético, uma carcterística de todas as ondas eletromagnéticas, a orientação da etiqueta com relação ao leitor influencia na intensidade do sinal refletido e, conseqüentemente, a distância máxima de leitura. Para evitar que isso permita que compradores mal-intencionados utilizassem essa limitação para furtar objetos, as leitoras que ficam na porta geralmente utilizam várias antenas, arranjadas em forma de “oito”. A orientação continua sendo importante, mas, dessa forma, uma leitura é possível em qualquer direção.
            Não se pode excluir medidas convencionais de segurança, uma vez que existem meios de burlar esses sistemas. Entre os mais conhecidos estão a remoção da etiqueta identificadora, sua desativação -quando aplicável-, o bloqueio por objetos metálicos e o embaralhamento do sinal de rádio, através de aparelhos construídos para este fim. Um ladrão bem-informado sempre encontrará meios e ferramentas para inutilizar sistemas de segurança, sendo necessário que os funcionários trabalhem para coibir tais práticas.

     •  Controle de acesso
            Em 1973 surgiram as primeiras patentes de tecnologias empregando o conceito de FRID, embora o acrônimo ainda não tivesse surgido. Charles Walton, um empreendedor californiano recebeu a patente de um transponder passivo que podia ser utilizado para abrir uma porta sem a necessidade de chaves. O cartão comunicava, a um leitor próximo à porta, seu código de identificação. O leitor, ao reconhecer um código válido, passava um sinal à fechadura para que destravasse.
            Ele chegou a apresentar sua tecnologia para o conselho diretor da General Motors, que a rejeitou por ser extremamente futurista. A invenção seguiu sem crédito por um ano até ser licenciada para uma grande fabricante de fechaduras do mercado americano.
            O primeiro protótipo de leitor seria considerado grosseiro para os dias de hoje. Contava com uma placa de circuito de 15cmX15cm dotadas de espiras e outros componentes comuns nos anos 70. Ainda não existiam CI’s que pudessem abrigar o sistema completo, uma vez que esses só viriam quase 10 anos depois com a onda de miniaturização. Os cartões, por sua vez, eram passivos, significando que não consumiam energia própria, “acordando” apenas ao receber uma freqüência específica do leitor que os fazia emitir sua identificação. A leitura podia ocorrer a até 15cm da base.
            A empresa tentou ainda adaptar o modelo para a cobrança automática de pedágios, colocando o cartão próximo da placa e leitores ao longo da via. A idéia era promissora, visto que não muito depois passou a ser largamente empregada, essa implementação, específicamente, não obteve sucesso.
            O governo americano também estava investindo pesado no desenvolvimento de sistemas de controle de acesso. Nos anos 1970, o Los Alamos National Laboratory, ainda hoje referência em RFID, recebeu a tarefa de desenvolver um sistema de rastreamento de material nuclear para o Departamento de Energia. O sistema consistia de duas frentes: identificação do material nuclear e controle de acesso.
            Para identificação, foi desenvolvido um leitor móvel que podia checar rapidamente as etiquetas colocadas nos grandes contêineres de armazenamento. Era essencial que os técnicos pudessem executar esta tarefa o mais rapidamente possível e essa solução se mostrou muito eficiente nesse aspecto. Seus leitores móveis inspiraram os dispositivos portáteis que se vê hoje em dia, chegando a medir menos que um celular.
            No campo do controle de acesso, resolveu-se por colocar leitores nos portões das bases e transponders nos caminhões. Esse tipo de transponder ativo respondia à interrogação do leitor, dando sua identificação e, opcionalmente, a identificação do motorista.
            Os cientistas que trabalhavam nesse projeto deixaram o laboratório para começar uma empresa própria. Desenvolveram o sistema aplicado atualmente em pedágios ao redor do mundo em que os identificadores ficam no parabrisa e os leitores na própria praça de pedágio.

     •  Identificação Animal
            A pedido do departamento de agricultura, o laboratório em Los Alamos também desenvolveu um sistema para o rastreamento de vacas. Os animais estavam recebendo hormônios e remédios quando adoeciam, mas havia grande dificuldade em saber que animais recebiam a dosagem correta ou recebia duas doses acidentalmente. Desenvolveram um sistema que usava ondas de rádio UHF (Freqüência Ultra-Alta, na sigla em inglês). O dispositivo implantado nos animais utilizava a energia emitida pelo leitor e simplesmente refletia de volta um sinal modulado, tecnologia conhecida como backscatter, numa referência literal ao processo de reflexão empregado.
            O sistema foi inovador pois foi o primeiro a incluir uma sub-banda. Cada leitura retornava não apenas 12 bits de informação digital - que compunham a identificação - como também um canal analógico – a sub-banda – que foi usada para transmitir a temperatura. Este novo método pemitia saber a temperatura do animal sempre que este se aproximava de pontos de controle, instalados próximo a fontes de água e alimento. Esperava-se que um histórico de atividade e temperatura acarretasse uma rápida intervenção veterinária quando necessário e até o diagnóstico de doenças.

topo